O MUNDO MATEMÁGICO & MAGILÓGICO DE ESCHER
Minha filha, 13 anos, já houvera ido por duas vezes à exposição, primeiramente com sua mãe, em seguida com a escola, e me seduzira com seu relato do extraordinário que enxergara. Seguinte domingo de outono, para lá me dirigi.
Ao entrar no museu, após duas horas de uma interminável fila, o massivo traçado da turba a subir e a descer autômata por aquelas escadarias dos quatro nobres andares do restaurado casarão, irônica sincronicidade, traduzia ipsis literis a famosa Relatividade de Escher, litografia do mestre, de 1953, hoje eternizada. Ao passar pela cancela, a mim descortinou-se um universo de imagens inauditas, em tudo distintas do óbvio cartesius ululante. Abduzido pela genialidade de Maurício Cornélio Escher (1898-1972), por suas gravurentrelinhas fui levado a vislumbrar seus multespelhos de sempre novos prismolhares.
E foi assim, meio sem querer e quasolhando, que no corredor elíptico do segundo andar, ao sair do espetacular filmanimado 3D de oitinfinitos minutos, me deparei com Alan Rodrigues, enxadrista dos tempos de Colégio, confrade de Ordem, hoje engenheiro químico e pianista-mor dos saraus que promove em sua casa, para os quais nunca convida mais do dois ou três amigos. Absorto em tomar notas, o amigo parecia hipnotizado por aquelas simetrias e escorregamentos das litogravuras, pasmo diante de alguns trabalhos de Escher cujos limites circulares envolvem anjos que se tornam demônios, também peixes e planárias que se transmutam uns nos outros, entre outras figurativas antíteses. Alan rabiscava num pequeno bloco e em diferentes perspectivas os cinco sólidos de Platão. Aproximei-me um pouco mais, ao que ele, surpreso, exclamou:
— Você, aqui?!
— E maravilhado de leste a oeste! Nas pegadas do iniciado Escher, um dos Mestres Perfeitos de nossa Ordem.
— Tudo aqui é um só fantástico alicespelho! – fabulou Alan, em alusão a Lewis Carrol, pseudônimo do matemáticos Charles Dogson (1832-1898), outro ilustrado membro de nossa confraria. E completou: — tudo aqui são esquadros e compassos de múltiplos de assombros, oculta geometria sagrada, arte simbólica oculta pelos sete véus de Ísis!
Decidimos então descer ao térreo, a tomar um café entre colunas. Para tanto, optamos fazê-lo pelas escadas de emergência que se achavam livres dado ao descuido dos seguranças, já que as demais escadarias se faziam tomadas por incessante burburinho de marchantes formigas que, robotizadas, cumpriam o itinerário previsto da tira de Möebius, andando cegas, cada qual em sua paralela e individual realidade. E foi assim que discretamente chegamos ao rés do chão, a fim de uma visita à livraria e também de um capuccino. À mesa, repassadas algumas memórias do tanto que já fizemos juntos, Alan me abriu seu bloco, revisitou suas anotações e destacou-me a folha em que havia escrito um soneto, composto naquela mesma tarde, entre imagens e viagens, no meio de tantos e ninguém. E é com sua devida autorização que o publico-o avant-première em nossa galeria, e, sendo impossível ilustrá-lo devidamente, escolhi algo de mestre Escher que se lhe soe em traços e temas pertinente:
SONETOGRAVURA
Discorrendo sobre Escher de ilusórias
formas em percepções de não traçadas
linhas de visão minhas abraçadas
planespacinfiniti-hipersensórias…
Meu microtelescópio de enlaçadas
imagens, facespelho em promontórios,
são concaveconvexos palavrórios,
pegadas lodo-e-areia descalçadas.
Os planos se sucedem aforespaço,
as linhas criam vida permanente,
mistérios desafiam mestremescher…
Dados de Platão, sólido presente,
sou divinestad’almestrela Vésper,
crepúsculo da aurora, eu sou o que traço!
Alan Rodrigues de Carvalho
Na metamorfescher de 22/V/2011,abismado diante dos insolituniversos
das lito-xilogravuras expostas.
Escher nos espelha o infinito que constitui a Realidade intrínseca de cada ser, paralém das ilusões que nos confundem a identificarmo-nos com cacos, quinquilharias…não, somos Eros, somos Hórus, somos os raios do sol resplandecente nas águas do oceano.